Este é um não-texto sobre você.
Textos tentam me ocorrer… mas eu não quero escrever sobre você…
Estou farta de escrever sobre o que me abandona. Sobre pedaços de desamor que me acompanham ao longo da vida.
Enquanto tento me reencontrar e me entender em minhas raízes, um programa de tv me mostra todo um roteiro de você… Lugares por onde passou e que queria me levar. Lugares pra onde talvez um dia você vá voltar. Sem mim.
E os lugares de dor em que me encontro já são duros demais pra que eu suporte os lugares de amor que não mais estarei.
Não quero escrever sobre você… porque escrever sobre você seria escrever sobre passado. Sobre o que não existe mais, ou nunca existiu. Escrever é quase sempre um lugar de me encontrar na dor… Ou na esperança… E hoje… eu tento não cultivar nenhum dos dois.
Preciso não cultivar nada para me permitir ser, apenas… Cultivar minha própria existência… meu respirar…
De todos os meus desamores, essa é a vez em que me sinto menor… mais frágil… pequena dentro da minha imensidão…
Não caibo mais em minha própria cama… Em meu quarto, agora menor… Não caibo em meu banheiro enquanto deixo a água correr em meu corpo que já não me cabe mais.
Dentro de todo o amor que sinto… não me cabe…
Sou uma roupa grande demais pros quilos que perdi. No entanto, parece que peso mais do que nunca pesei.
Enquanto desapareço sutilmente de você, não quero aparecer em lugar algum. Escolho sumir do mundo, me desaparecer enquanto imagem, me desapegar de mim… Pra me apegar de volta ao que realmente me importa.
O que me trouxe aqui…?
Quem são as mulheres que em mim habitam?
Como posso amá-las… e respeitá-las… e protegê-las… sem privá-las?
Qual é a medida do equilíbrio entre a esperança e a fé cega? A medida do amor… e do sofrer…? O quanto de si é possível doar sem se perder?
Quem eu sou?
Quem eu quero ser?
Agora que não sou mais você…
Eu nunca senti tanta dificuldade em tocar os pés no chão como agora. Às vezes parece que virei uma poeira no tempo… Fininha…. me misturando… Num instante, presente, noutro desintegrando.
Sinto minha potência mais intensa do que nunca. No entanto, estou me esmagando.
Justo eu, que prego que só se morre de amor no cinema… Parece que de amor morro todos os dias desde que nasci.
Nasci, morri, e continuo morrendo toda a minha vida… E revivendo… na teimosia em ser amor… Em ser um amor maior que existe… Que ninguém vê… Um amor em que não se acredita…
Eu sou um amor impossível…
Eu não quero escrever sobre você… porque eu não sei…
Eu não sei falar de você…
Eu não sei falar pra você…
Eu só sei viver você… Te fazer me viver…
O meu defeito é querer você sem deixar de me querer. É querer que você se queira também. É acreditar que a única forma de não doer é doar… Acreditar… Se entregar…
Por que… afinal, o que é o medo de cair pra quem passou mais tempo no chão que no colo? O que é o medo de perder, e ter que se reinventar, pra quem se reinventa de novo todos os dias?
A dor já não me intimida mais…
Conheço como a palma da minha mão.
Tudo o que eu queria era conhecer o outro lado…
E é por isso que eu não posso escrever sobre você…
Você foi o outro lado. Até não mais ser.
Ao som de: Songs for u.
Ao drink de: doses secas de saudade.
Imagem: Adna Lhöz
“You could be happy, I hope you are
You made me happier than I’d been by far
Somehow everything I own smells of you”
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